BRASIL - Muitos beneficiários do programa Auxílio Brasil foram surpreendidos nesta semana ao abrir o aplicativo Caixa Tem para conferir o valor do benefício que receberão em novembro.
Para essas pessoas, o aplicativo mostrava apenas R$ 240 reais a serem recebidos, ou valores próximos a isso. E o Caixa Tem também não mostrava os R$ 200 de benefício complementar, previstos para serem pagos até dezembro.
Nesse mês de novembro, começaram a ser descontadas na fonte ? isto é, direto do benefício pago pelo governo ? as parcelas de quem pegou o empréstimo consignado do Auxílio Brasil em outubro.
O desconto, no entanto, veio antes do que o esperado para muitos dos beneficiários, que relatam terem sido informados pelas instituições financeiras de que as parcelas seriam descontadas apenas a partir de dezembro ou janeiro.
Também há inúmeros relatos de pessoas que dizem não terem contratado o empréstimo ou terem contratado, mas ainda não terem recebido o valor, e que mesmo assim estão tendo as parcelas descontadas.
Para quem está com dúvidas sobre o que está acontecendo, preparamos um guia simples.
Auxílio Brasil
O Auxílio Brasil foi criado em dezembro de 2021, por meio de uma lei que extinguiu o antigo programa Bolsa Família.
Foi uma tentativa do presidente Jair Bolsonaro (PL) de imprimir uma marca própria na assistência social, às vésperas do ano eleitoral, apagando o nome fortemente associado às gestões petistas.
A proposta original do governo previa um valor de R$ 400 válido somente até dezembro de 2022, mas uma emenda na Câmara dos Deputados tornou o benefício permanente.
Em junho deste ano, com Bolsonaro em segundo lugar nas pesquisas eleitorais, o governo decidiu ampliar o benefício para R$ 600, mas novamente com validade somente até dezembro.
Por esse motivo, os R$ 600 são pagos em dois blocos no Caixa Tem: R$ 400 de Auxílio Brasil e R$ 200 do benefício complementar válido até dezembro.
Consignado do Auxílio Brasil
Também em junho, durante a campanha eleitoral, o governo anunciou a criação do crédito consignado do Auxílio Brasil, um empréstimo garantido pelo benefício social, com as parcelas da dívida descontadas na fonte.
A regulamentação do empréstimo saiu apenas ao fim de setembro, estabelecendo um limite de juros de 3,5% ao mês ou 51,5% ao ano, acima da média de outros consignados, segundo dados do Banco Central.
Enquanto o Auxílio Brasil de R$ 600 começou a ser pago em agosto, o consignado ? com valor médio de R$ 2.600 ?, passou a ser pago a partir de 10 de outubro, entre o primeiro e o segundo turnos das eleições.
Em apenas 11 dias, até 21 de outubro, a Caixa já havia emprestado R$ 4,3 bilhões, para 1,7 milhão de pessoas. Outras 11 instituições financeiras privadas também estão autorizadas a conceder crédito nessa modalidade.
No dia 4 de outubro, a Caixa anunciou a suspenção temporária da oferta do consignado até o dia 14, para processar a folha de pagamentos do Auxilio Brasil de novembro. Os pagamentos devem ocorrer entre os dias 17 e 30 de novembro.
Calendário de pagamentos do Auxílio Brasil em novembro.
- Final de NIS 1: 17 de novembro
- Final de NIS 2: 18 de novembro
- Final de NIS 3: 21 de novembro
- Final de NIS 4: 22 de novembro
- Final de NIS 5: 23 de novembro
- Final de NIS 6: 24 de novembro
- Final de NIS 7: 25 de novembro
- Final de NIS 8: 28 de novembro
- Final de NIS 9: 29 de novembro
- Final de NIS 0: 30 de novembro
1) Por que o Caixa Tem mostra apenas R$ 240 de Auxílio Brasil em novembro para parte dos beneficiários?
Quem tomou o empréstimo consignado poderá ter descontado até 40% do Auxílio Brasil para pagamento da dívida, conforme portaria que regulamentou a modalidade.
Mas esse desconto só incide sobre os R$ 400 do benefício permanente, não sobre os R$ 200 adicionais pagos até dezembro. Assim, a parcela tem valor máximo de R$ 160 (isto é, 40% de R$ 400) e o pagamento pode ser feito em até 24 parcelas.
Quem tomou um empréstimo de R$ 2.600, por exemplo, e pagar 24 parcelas de R$ 160, vai acabar pagando de volta R$ 3.840. Ou seja, quase 50% a mais do emprestou.
Para quem tomou o empréstimo em outubro, as parcelas começam a ser descontadas agora em novembro.
2) Me disseram que o desconto só aconteceria em dezembro. Por que então ele está sendo cobrado agora?
A Caixa afirma que "atua como agente operador do Programa Auxílio Brasil e que os descontos obedecem a averbação realizada pelos bancos junto à Dataprev".
Ainda segundo o banco, a Portaria 816/2022 do Ministério da Cidadania, que regulamentou o consignado do Auxílio Brasil, estabelece que o primeiro desconto no benefício ocorre no primeiro mês subsequente ao do envio das informações pelas instituições financeiras.
"Vale destacar que qualquer desconto com prazo inferior a 30 dias da liberação do recurso está em desacordo com a legislação de crédito", afirma Ione Amorim, coordenadora do Programa de Serviços Financeiros do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor).
"Os bancos que realizarem descontos antes do prazo devido devem receber sanções do Banco Central que pode chegar à suspensão para operar o crédito."
Ela observa porém que, como o calendário de pagamento do Auxílio Brasil está previsto para acontecer entre 17/11 e 30/11, em tese não haveria desconto antecipado para quem contratou o benefício em outubro.
3) No Caixa Tem ainda não aparece o benefício complementar de R$ 200. Por que não e quando esse valor deverá aparecer no aplicativo?
Procurada, a Caixa não respondeu a esse questionamento.
Mas pessoas familiarizadas com o pagamento do Auxílio Brasil em meses anteriores afirmam que é comum o aplicativo mostrar primeiro o valor do benefício permanente (R$ 400 ou agora R$ 240 para quem tomou o consignado), para só depois mostrar o complemento de R$ 200.
Vale lembrar que esse mês também não há pagamento do Auxílio Gás. Como esse benefício é bimestral e já foi pago em outubro, o próximo ciclo será somente em dezembro.
4) Não fiz o empréstimo ou ainda não recebi, mas meu auxílio já está sendo descontado. O que fazer?
Caso o beneficiário não reconheça o empréstimo consignado que está sendo descontado em seu benefício, a Caixa orienta que seja procurado o banco em que o contrato foi celebrado para verificação. A informação do banco pode ser obtida junto ao Ministério da Cidadania, por meio do telefone 121.
Para contratos celebrados com a Caixa, o banco disponibiliza atendimento nas agências, devendo ser apresentado o CPF e documento de identificação com foto.
A portaria que regulamentou o consignado diz ainda que "nas situações em que for constatado o desconto indevido de parcelas de empréstimo consignado em benefícios do Programa Auxílio Brasil em decorrência de contratação indevida, divergência a maior do valor contratado ou em que o desconto ocorra em valor superior ao limite estabelecido em lei, caberá exclusivamente à instituição financeira a responsabilidade pela devolução do valor consignado indevidamente".
Caso a reclamação junto ao banco não funcione, o Idec afirma que os beneficiários devem entrar no canal do Consumidor.gov.br, que é vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, para registrar reclamação e exigir a devolução dos descontos indevidos.
"No caso em que o banco não reconhecer a cobrança indevida e não fizer o ressarcimento, o banco ainda deverá fazer o pagamento em dobro, conforme prevê o Código de Defesa do Consumidor em seu Artigo 42", diz Ione Amorim, do Idec.
O Procon de São Paulo também afirma que os Procons estaduais podem ser procurados pelos consumidores.
Segundo o órgão de defesa do consumidor, as reclamações sobre crédito consignado crescem ano a ano. Foram 2.505 em 2019, 6.502 em 2020 e 8.355 em 2021. Esse ano, já foram feitas 4.602 reclamações sobre essa categoria de empréstimo ? e isso somente até setembro, antes do início da operação do consignado do Auxílio Brasil.
Conforme a especialista do Idec, esses problemas podem ter ocorrido por instabilidades do sistema que aconteceram, por exemplo, com Caixa, Banco Pan e a fintech Meu Tudo.
"Essa bagunça toda pode ter gerado operações não consolidadas, ou seja, o dinheiro não foi entregue, mas o sistema considera a operação realizada", diz Amorim.
"É possível também a existência de casos de fraudes, com operações não solicitadas e dinheiro desviado para contas desconhecidas, como aconteceu com os beneficiários do INSS em 2020, quando ocorreu o aumento da margem [de consignação] de 30% para 35%."
5) Meu benefício está bloqueado ou fui excluído do Auxílio Brasil. Ainda assim tenho que pagar a parcela?
Como qualquer outro empréstimo, é necessário pagá-lo, já que o valor emprestado foi recebido. Em caso de cancelamento do benefício, a Caixa vai passar a descontar o valor por meio do débito em conta.
Se não existir autorização para isso, ou se não tiver saldo disponível para o débito, a 2ª via do boleto com o valor atualizado pode ser emitida no site Caixa.
"Caso não seja feito o pagamento até a data do vencimento, a dívida aumenta com o passar do tempo, pois tem juros e multa pelo atraso. Por isso, o quanto antes regularizar a dívida, menos vai pagar por ela. Além disso, dívidas atrasadas geram dificuldades para conseguir novos empréstimos", diz o banco.
6) O desconto do Auxílio Brasil em novembro tem a ver com eleição de Lula?
Em meio à confusão dos beneficiários com o início dos descontos sobre o Auxílio Brasil, diversos perfis de apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (PL) iniciaram uma campanha de desinformação, atrelando a redução do benefício à eleição de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Os descontos acontecem, porém, devido ao pagamento do consignado do Auxílio Brasil, modalidade de empréstimo criada pelo governo Bolsonaro.
Para 2023, ainda não há certeza sobre qual será o valor do benefício social.
A equipe de transição de Lula, cuja área de assistência social está sendo capitaneada por Simone Tebet (MDB), já declarou a intenção de voltar a chamar o benefício de Bolsa Família e de manter o valor em R$ 600 no próximo ano, com um benefício adicional de R$ 150 por filho de até seis anos de idade.
A equipe de transição agora articula junto ao Congresso para conseguir espaço no Orçamento para essa despesa. Ganha força a hipótese de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) para deixar o Bolsa Família fora da regra do teto de gastos pelos próximos quatro anos.
Via: UOL Notícias
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